Si me permitem hablar...

"Em Cochabamba, as pessoas têm a cultura de ir à praça central discutir política, todos os dias. Muita gente sai de seus trabalhos no final do dia e antes de ir para casa vai à praça ouvir, falar e discutir a política."
A observação da jornalista Fania Rodrigues ao entrevistar Domitila Barrios de Chungara, líder sindical nas minas da Bolívia. História impressionante. "Eu tive a sorte de escutá-la", disse Eduardo Galeano.

Domitila, com 73 anos, e seu companheiro, mantém em casa uma escola de formação política. "Agora temos que formar uma nova geração."

Praça da Liberdade - BH

Formar politicamente uma nova geração.
Não li ou ouvi de ninguém essa sugestão ao acompanhar as discussões sobre os casos chocantes de violência e discriminação contra brasileiros do nordeste e contra homosexuais, praticados nos últimos dias por nossos meninos bem educados.
Todos estão buscando explicações e soluções para as agressões. Discussão necessária, sem dúvidas. Discute-se o que falta ou - mais provável - o que sobra a esses adolescentes. Entre os pais, percebe-se um certo constrangimento ao afirmarem - e todos afirmam - que seus filhos não! Não fariam isso! Mas... Não mesmo? É fácil notar que essa dúvida persegue muitos. Até porque as explicações encontradas, na sua maioria os apontam, os pais, como responsáveis por esse comportamento lamentável.

Mas como poderia essa geração, os pais desses adolescentes - vivendo no "esquecimento da política" em que vivem - formar politicamente seus filhos? O que aprendeu sobre política um yuppie nos anos 80? O que aprendemos sobre política nós que fomos adolescentes na década de 70/80? Asfixiada sob coturnos, a política nos dava medo... E "nosso inimigo principal é o medo, e o levamos dentro de nós", Domitila dizia há 30 anos.

Recentemente, conversando com o filho de 15 anos de um amigo, perguntei se na escola estudavam política. "Não. Os professores não podem falar de política na sala de aula". Regra da escola. E o que seria falar de política na sala? "Falar sobre candidatos à eleição ou partidos". Se a escola oferecesse uma matéria sobre política, o que acharia? "Bom. Gostaria de saber como é o Congresso, a Câmara, como funcionam". O que mais acha que seria ensinado nessa matéria? "Sobre eleições..." Preciso admitir que se fizesse as mesmas perguntas para os adultos que conheço, 90% dariam as mesmas respostas.

A origem da política é a palavra, a palavra pública, como na praça de Cochabamba. Ela só precisa ser resgatada. E deveria ser das escolas a iniciativa do resgate e o seu exercício, inclusive como forma de socialização entre os alunos. Fazer com que esses quase adultos discutam publicamente - ainda que a praça seja o pátio de suas escolas - os seus monstros, a violência dos seus iguais, o seu narcisismo, o consumismo, o vazio... e encontrem suas próprias respostas e soluções. A seu favor, essa geração terá a liberdade de se expressar que não tivemos. Contra, terá a própria escola. Enquanto ela mesma for uma mercadoria, com etiqueta, status e tudo o mais, não há de querer alunos politizados. A mediocridade lhe convém.

Trechos da entrevista de Domitila Barrios a Fania Rodrigues
http://carosamigos.terra.com.br/  edição de set/2010

.

Comentários

Postagens mais visitadas